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segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Fisioterapia no tratamento da cefaleia do tipo tensional


 
Dentre as cefaleias primárias, a cefaleia tensional de forma episódica é considerada o tipo mais frequente. Entre outros fatores, os psicopatológicos são os predominantes no desenvolvimento desse tipo de cefaleia.
As cefaleias cervicais podem ocorrer devido à alterações nas vértebras cervicais altas, com manisfestações dolorosas principalmente na região occipital (base do crânio) dependendo da localização da vértebra afetada. 
Para entender melhor a relação entre as alterações no posicionamento cervical e as dores na cabeça e na face é preciso primeiramente saber que este tipo de cefaleia é uma forma de dor referida oriunda dos três primeiros segmentos da coluna cervical, onde está localizado o núcleo trigeminal da medula espinhal.
A cefaleia tensional episódica, caracteriza-se por durar entre 30 minutos e 7 dias e apresentar um ou menos episódio de dor de cabeça por mês. Sua dor é descrita como uma pressão bilateral e não se agrava ao realizar esforços ou atividades diárias. Diferentemente da enxaqueca, as cefaleias não são acompanhadas de náusea e vômitos
Elaborado o diagnóstico correto, muitas da cefaléias primárias podem ser abordadas com sucesso pelas técnicas da osteopatia e da quiropraxia, onde através de técnicas direcionadas para a normalização dos micromovimentos dos ossos do crânio e da coluna cervical, será possível influenciar positivamente a vascularização e a drenagem venosa intracraniana, bem como os impulsos neurológicos provenientes da coluna cervical.barriga
 
É necessário considerar traços característicos de uma dor de origem cervical :
 
- Começo repentino logo após um movimento brusco do pescoço;
-Dor unilateral occipital ou suboccipital;
-Dor que aparece com movimentos do pescoço;
-Postura anormal de cabeça e pescoço;
-Limitação dolorosa da cervical superior;
-Mobilidade anormal na união crânio vertebral.




Em relação ao tratamento fisioterapêutico, técnicas de terapia manual baseadas em mobilização articular e desativação de pontos gatilho de dor miofascial, tem alto índice de evidência para tratamento de desordens crânio-cervicais, devendo ser utilizadas como terapia inicial para controle dos sintomas que uma vez controlados, evolui-se o tratamento para a terapia postural objetivando posicionar da melhor forma possível a cabeça sobre a coluna cervical, a fim de aliviar estresses desnecessários sobre os tecidos de sustentação, melhorando a estabilidade cervical.



DR. ANTONIO VIANA DE CARVALHO JÚNIOR (FISIOTERAPEUTA)
Especialista em Fisioterapia Traumato-Ortopédica
Osteopatia e Quiropraxia
Terapia Neural e Dry Needling
Tratamento de Disfunções da ATM e Algias da Coluna Vertebral

Rua Solon Pinheiro 1539, Bairro de Fátima
(85) 8845-9623 / 9955-7355

domingo, 2 de novembro de 2014

Fisioterapia e Dor Orofacial

Fisioterapia e Dor Orofacial

Anatomicamente podemos seguir a seguinte divisão relacionadas a Dor Orofacial

REGIÃO CRÂNIO-CERVICAL - todas as estruturas anatômicas que se encontram entre occipital e C3 (músculos cervicais, articulações, ligamentos)
REGIÃO CRÂNIO-FACIAL- todas as estruturas anatômicas e funcionais do crânio, exceto para a ATM (vasos, olhos, ossos crânio)
REGIÃO CRÂNIO-MANDIBULAR - todas as estruturas que estão anatomicamente e funcionalmente ligados à ATM (disco, zona bilaminar, etc)
O papel do tratamento Fisioterapêutico que aborda as regiões facial, mandibular, intra-oral, cefálica, cervical e dorsal, além da cintura escapular. Em linhas gerais, a Fisioterapia pode tratar as patologias articulares, dores e disfunções musculares, alterações funcionais, posturais, neurológicas e circulatórias que afetam estas regiões, além de melhorar as condições do tecido cicatricial.
Restabelece as funções dos sistemas craniovertebral e craniomandibular
Entre causas de Dor orofacial, temos entre as principal senão a principal a DTMs, causadas por: dor miofascial,  deslocamentos do disco articular da atm e alterações degenerativas da ATM.

Os objetivos do tratamento fisioterapêutico para dor miofascial são: a identificação dos trigger points, sua inativação, e o retorno à função normal sem dor.
Os casos de deslocamento de disco, mesmo aqueles em que o paciente só se queixa de estalido, sem travamento ou dor, devem ser acompanhados.
O paciente deve ser instruído sobre possíveis complicações futuras e orientado a diminuir a sobrecarga na região de ATM.

As alterações degenerativas da ATM podem apresentar-se com ou sem dor. A preocupação é melhorar a condição articular, diminuindo a pressão intra-articular e permitindo o retorno à função mandibular normal.
O tratamento da dor orofacial começa com um conhecimento minucioso da queixa de dor do paciente. Somente com esta condição pode ser feito um diagnóstico correto e selecionar o tratamento. Deve ser realizada uma anamnese completa, exames complementares e exames radiográficos apropriados, testes de diagnóstico diferencial. O paciente deve descrever detalhadamente os sintomas e é realizada palpação da face e mandíbula (articulação e músculos da mastigação) para definir os locais de dor ou hipersensibilidade, ausculta dos ruídos articulares e observar a limitação ou travamento do movimento de abertura e fechamento da boca.

Diagnóstico diferencial
 
·        Desordens de dor intracranianas: as desordens das estruturas intracranianas, por exemplo, neoplasmas, aneurismas, abscessos, hemorragias ou hematomas e edemas, devem ser consideradas em primeiro lugar no diagnóstico diferencial, pois põem a vida em risco e podem requisitar atenção imediata. As características das desordens intracranianas graves incluem nova ou abrupta instalação da dor ou dor progressivamente mais severa, interrupção do sono pela dor, e precipitação da dor por esforço ou mudança de posição (tossir, espirrar). Outros sintomas são perda de peso, fraqueza e febre com dor.
·        Transtornos de cefaléia primaria (transtornos neurovasculares): enxaqueca, variantes da enxaqueca, cefaléias em salvas, hemicrânia paroxística, cefaléia tipo tensão.
·        Desordens de dor neurogênica : são condições dolorosas que têm origem em estruturas neurogênicas, como nevralgias do trigêmeo, glossofaríngeo, nervo intermédio. Como as estruturas somáticas não estão afetadas, o exame falha em revelar qualquer causa obvia ou condição patológica, isto pode impor dificuldades no diagnostico. A dor geralmente é descrita como uma dor persistente, progressiva e com sensação de queimação. Os pacientes com freqüência relatam sensações anormais (disestesia) que são exacerbadas pelo movimento ou toque.
·        Desordens de dor intra- oral: a dor intra- oral é a fonte mais comum de dor orofacial, estas incluem desordens de polpa dentaria, periodonto, tecidos mucogengivais e língua. Muitas destas desordens só são tratadas pelo cirurgião-  dentista.
·        Desordens temporomandibulares: desordens temporomandibulares (DTM) é um termo coletivo que inclui vários problemas clínicos envolvendo os músculos da mastigação ou ATM. As desordens temporomandibulares foram identificadas como a principal causa de dor não- dental e são consideradas como uma classificação das desordens musculoesqueleticas.
·        Desordens de dor de estruturas associadas que podem produzir dor orofacial: varias estruturas como orelhas, olhos, nariz, seios paranasais, garganta, linfonodos, glândulas salivares e pescoço podem ser responsáveis pela dor orofacial. Muitas destas estruturas produzem dores heterotópicas manifestadas nas estruturas orofaciais, podendo ser confundidas com dor de dente ou DTM.
·        Fatores psicossocias: há muitos fatores psicossocias que contribuem para a experiência de dor do paciente. Fatores de stress podem aumentar a tensão, insegurança e disforia, causando por sua vez o aumento das atividades do sistema mastigatório através de comportamentos parafuncionais não usuais. A depressão, ansiedade e sentimentos negativos prolongados são comuns entre pacientes com dor crônica e podem tornar a dor persistente mais difícil de tolerar ou de tratar. Deve ser enfatizado que os transtornos mentais e orofaciais não são condições mutuamente exclusivas. Indivíduos com distúrbios psiquiátricos podem ter desordens orofaciais dolorosas verdadeiras, e inversamente, a falta de achados orgânicos claros em pacientes com sintomas persistentes de dor orofacial é insuficiente para sugerir origem psicogênica para essas queixas.
O tratamento da dor orofacial começa com um conhecimento minucioso da queixa de dor do paciente. Somente com esta condição pode ser feito um diagnóstico correto para selecionar o tratamento.

O tratamento visa reestabelecer a estrutura afetada quando detectada, uso de medicamentos analgésicos específicos para os diferentes tipos de dores, terapias comportamentais, fisioterapia, cirurgias e, atualmente, alguns procedimentos minimamente invasivos que bloqueiam a condução do estímulo doloroso.
O Tratamento fisioterapêutico tem como objetivo:

. Minimizar a sintomatologia dolorosa;
. Restaurar a função muscular;
. Melhorar a amplitude de movimento;
. Redução de tensões musculares exacerbadas e pontos gatilhos;
. Melhorar a postura, sobretudo de cabeça e coluna cervical;
. Reduzir a carga na articulação temporomandibular, evitando a necessidade de cirurgias articulares

Técnicas utilizadas:

• Exame da ATM e Postura Coporal

• Relaxamento Muscular Endobucal (Masséter, Pterigóideos Medial e Lateral, Temporal);

• Relaxamento Muscular cervico-cranio-mandibulares (Trapézio, Escalenos, Esternocleidomastoideo, Infra-hioideos, Supra-hioideos entre outros)

• Liberação articular da cervical alta e baixa com mobilizações

• Liberação articular da ATM com mobilizações
Manobras Intra-orais Drenagem Linfatica Facial
Inibição Muscular Reflexa
Osteopatia, Mulligan
Terapia Neural
Dry Needling




Dr. Antonio Viana C Junior (Fisioterapeuta)
Especialista em Fisioterapia Traumato-Ortopedica
Osteopatia, Quiropraxia
Tratamento de Disfuncoes da ATM e Pos-Operatorio de Cirurgias Ortognaticas

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

DTMs debatidas no I Congresso de Fisioterapia do Delta do Parnaíba – I COFIDEP

O I Congresso de Fisioterapia do Delta do Parnaíba – I COFIDEP


O I Congresso de Fisioterapia do Delta do Parnaíba – I COFIDEP vem com uma inovadora e ousada proposta que objetiva mobilizar a classe de fisioterapia no intuito de estimular a produção de pesquisas científicas e abordar temas atuais e importantes da Fisioterapia. Além de palestras de renomados fisioterapeutas, o congresso contará com apresentação de trabalhos na forma de tema livre oral, apresentação em pôster, minicursos e mesas-redondas que enriqueceram muito o nosso evento.
O encontro tem como objetivo principal promover a troca de conhecimentos, atualizar sobre as novas tendências e perspectivas profissionaisalém de estimular a produção científica, através da promoção de atividades que proporcionem o enriquecimento curricular do acadêmicoAo fim do encontro é esperado a atualização, evoluções em condutas e recursos fisioterapêuticos de todos os envolvidos, incluindo participantes, organizadores e convidados.

Mobilização Precoce

Maria Ayrtes Ximenes Ponte Colaço | Fortaleza - CE

Mapeamento Cerebral e Funcional

Victor Hugo do Vale Bastos - Parnaíba - PI

ABORDAGEM DE HIDROTERAPIA NO PACIENTE COM TCE

Any Carolina C. Guimarães

VENTILAÇÃO NÃO INVASIVA NA INSUFICIÊNCIA RESPIRATÓRIA AGUDA: DA EMERGÊNCIA A UTI

Ingrid Correia Nogueira | Fortaleza - CE

Reabilitação Ninfocinética no Paciente Oncológico

Vanessa Elenia de Brito Masullo | Teresina - PI

Ventilação Mecânica e Estresse Oxidativo

João Batista Raposo Mazullo Filho | Teresina - PI

ABORDAGEM DE HIDROTERAPIA NO PACIENTE COM TCE

Rodrigo Amorim Oliveira Nunes | Teresina - PI

Pilates

Adriana Silva de Barros | Fortaleza - CE

Podoposturologia e Palmilhas Posturais

André Alcântara Parente | Fortaleza - CE

- Terapia Manipulativa
- Disfunções Temporomandibulares: Da Cirurgia a Reabilitação

Antônio Viana de Carvalho Junior | Fortaleza - CE

- Disfunções Temporomandibulares: Da Cirurgia a Reabilitação

Darklilson Pereira Santos | Parnaíba - PI

- Abordagem Fisioterapeutica no Paciente Neonatal

Natália Mendes de Sousa Caldas

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Associação entre Sono e Dor Orofacial

Um tema muito prevalente na literatura atual refere-se a associação entre sono e dor. Muito se tem falado, mas muitas dúvidas ainda permanecem. Por exemplo, a relação de causalidade é bidirecional? E quais os mecanismos envolvidos entre estes dois fenômenos? É de suma importância que o profissional envolvido no tratamento da Dor Orofacial compreenda o impacto do sono sobre a dor e vice-versa.
A relevância desta interação fica evidente quando deparamos com índices que revelam que dor crônica afeta aproximadamente um quinto da população adulta e que, aproximadamente dois terços dos pacientes com dor crônica relatam sono ruim e fadiga como queixa secundária. As queixas subjetivas do sono mais frequentes em pacientes com dor crônica são insônia (dificuldade de iniciar o sono ou permanecer adormecido ou acordar muito cedo), sono não reparador e sonolência diurna excessiva ou fadiga. Já as anormalidades do sono mais comuns nos pacientes com dor crônica avaliadas por exames objetivos e quantitativos (Polissonografia/Actigrafia) incluem fragmentação do sono, eficiência de sono diminuída e redução de ondas lentas do sono, sendo algumas destas anormalidades específicas para certas condições de dor. Um relativo número de pacientes com dor crônica apresenta distúrbios do sono como Insônia, Síndrome da Apneia Obstrutiva do Sono (SAOS), Síndrome das Pernas Inquietas ou Movimento Periódicos de Pernas.
Os distúrbios do sono são comorbidades muito comuns também em pacientes com Dor Orofacial. A insônia foi o distúrbio do sono mais comumente diagnosticado (36%) em estudo polissonográfico de 53 pacientes com Disfunção Temporomandibular (DTM) do tipo Dor Miofascial; 28% dos indivíduos foram diagnosticados com SAOS e 17% com Bruxismo do sono. Ainda, 6% dos participantes apresentaram Insônia devido a DTM. A associação entre SAOS e DTM também é significativa na literatura. Em estudo de coorte prospectivo, com adultos livres do DTM inicialmente, sinais e sintomas de SAOS foram associados com o aumento da incidência da primeira ocorrência de DTM. Homens e mulheres com dois ou mais sinais/sintomas da SAOS tiveram 73% maior incidência de DTM. Um estudo caso-controle revelou que 4% dos participantes tinham risco para os sintomas da SAOS, e estes tiveram 3,6 vezes mais chances para ter ou desenvolver concomitante DTM crônica.
Os resultados dos estudos sobre a relação de causalidade, ressaltam a complexidade do relacionamento dor-sono, que varia de acordo com as características da amostra (aguda/ crônica; adultos/ adolescentes), a presença ou tipos de dor (DTM, artrites, cefaleias e outras), e o método de avaliação (subjetivo/objetivo). Entretanto, vários estudos que empregaram medidas objetivas e subjetivas de dor e sono fundamentaram a noção de que deficiência do sono é um preditor mais significativo de dor do que o contrário. Apenas dois estudos relataram bidirecionalidade equivalente; entretanto foram limitados pela sua dependência de instrumentos básicos de auto-relato para avaliação do sono e dor. Estudos longitudinais demonstraram que os sintomas de insônia aumentaram o risco de desenvolver distúrbios de dor crônica em indivíduos saudáveis. Ao contrário, dor pré existente não foi um preditor significativo de incidência de insônia.
Com relação especificamente as associações do Sono com as Dores Orofaciais notou-se que a condição mais abordada é DTM, e constatou-se que a insônia e distúrbios respiratórios são comorbidades comuns.
Quanto aos mecanismos envolvidos, sabe-se que as consequências da privação de sono estão sob controle dos sistemas de neurotransmissores dopamina, noradrenalina e serotonina. Principalmente as disfunções de neurotransmissão dopaminérgica tônica versus fásica aumentam a vulnerabilidade para desenvolver e/ou manter as comorbidades sono e dor crônica . Ainda, estudos indicam que catecol-o-metiltransferase (COMT) é um gene modulador da dor e diferenças alélicas foram relatadas em fibromialgia, osteoartrite, enxaqueca e cefaléia do tipo tensional, de tal forma que o genótipo de baixo metabolismo dopaminérgico tende a ser mais frequente nos casos do que nos controles. O aumento dos índices pró-inflamatórios através da ativação de respostas semelhantes à lesão aguda quando da privação do sono também está comprovado. Ainda, Substancias Regulatórias do Sono, (SRS) citocinas, incluindo interleucina 1 (IL-1), fator de necrose tumoral (TNF) e outras substancias que participam da regulação do sono (NREM) por sua vez agem sobre os neurônios para alterar suas propriedades intrínsecas de membrana e sensibilidades de neurotransmissores e neuromoduladores.
Sem dúvida, estes resultados têm potenciais implicações clínicas para avaliação e gestão da dor em pacientes que apresentam as comorbidades Dor Orofacial e Distúrbios do Sono. Neste sentido, o tratamento da Dor Orofacial deverá abranger padrões de sono. A inclusão de intervenções orientadas especialmente para os sintomas de insônia (distúrbio mais prevalente na dor crônica) poderá resultar em decréscimos aditivos, além das abordagens tradicionais de gerenciamento de dor. Abordagens simples com foco na educação do paciente, na higiene do sono e medicamentos para melhorar o sono e reduzir a dor serão muito benéficos. Quando, durante a anamnese inicial, um paciente com Dor Orofacial apresentar características de Insônia Crônica ou SAOS, é preciso encaminhá-lo para o especialista em Medicina do Sono. Melhorar a continuidade do sono pode melhorar a eficácia de tratamentos para DTM e outros distúrbios de dor e, eventualmente, ter benefícios preventivos.

Fonte:
Cláudia Aparecida de Oliveira Machado
Aluna do Curso de Especialização Dor Orofacial e DTM - IEO Bauru

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

O Impacto Psicológico da Cirurgia Ortognática

Para além do planejamento cirúrgico levando em consideração as expectativas do paciente, há de se levar em consideração o impacto que a cirurgia, uma vez realizada, provocará na psique do operado.  Neste momento, cabe ressaltar a importância psicossocial da face humana. A transformação que se inicia na aparência se mostra afinal, muito mais profunda.





Inicio essa análise contando um fato ocorrido em 2005, ocasião em que trabalhava em um importante hospital de trauma. Um paciente de 45 anos portador de prognatismo por deficiência ântero-posterior da maxila (maxilar superior para trás) foi vítima de um acidente de tráfego e teve a infelicidade de sofrer uma fratura maxilar do tipo Le Fort I (semelhante ao que é feito na cirurgia ortognática). O colega que o atendeu verificou que, embora o paciente nunca tivesse usado aparelho ortodôntico, a oclusão era mais estável quando a maxila era posicionada em posição considerada fisiológica, ou seja em Classe I, em detrimento do posicionamento original do paciente. O cirurgião entendeu que o paciente tinha ali, naquela situação desfavorável, uma oportunidade de corrigir seu problema de deformidade dento-facial, e assim o fez, na melhor das intenções. Ocorre que o paciente, após acordar e verificar seu novo perfil facial (visivelmente mais harmônico), ficou extremamente insatisfeito. Não conseguia aceitar as novas feições, e por diversas vezes ameaçou de processo o colega cirurgião.


O fato verídico acima relatado, nos leva a uma análise sobre a subjetividade deste processo. A auto-percepção da aparência é extremamente individualizada, e sofre diversas influências que devem peremptoriamente ser levadas em consideração no momento do diagnóstico e plano de tratamento nos casos de cirurgia ortognática. Por isso, a primeira consulta é o momento de escutar atenta e respeitosamente o que o paciente tem a dizer, para só então prosseguir na propedêutica essencialmente técnica. Em suma, não se logra êxito em conseguir um resultado tecnicamente impecável, se este não tem correlação com a expectativa do paciente.


Para além do planejamento cirúrgico levando em consideração as expectativas do paciente, há de se levar em consideração o impacto que a cirurgia, uma vez realizada, provocará na psique do operado. Cirurgias simultâneas de maxila, mandíbula e mento, sobretudo se utilizadas para corrigir grandes discrepâncias oclusais, sorriso gengivoso exuberante ou malformações genéticas costumam literalmente transformar aqueles que se submetem ao procedimento. Neste momento, cabe ressaltar a importância psicossocial da face humana. "O rosto humano é o palco da nossa identidade e é a parte que mais mostramos aos outros durante toda a vida" (Freitas – Magalhães 2007). Alguns estudos têm evidenciado que as pessoas com características físicas atraentes tendem a provocar expectativas ou impressões positivas nos outros com a obtenção de vantagens interpessoais. E quando uma pessoa não corresponde aos padrões sociais de beleza física, tende a induzir impressões negativas nos outros, sendo-lhe exigido melhores resultados e responsabilidades sociais (Belluci & Kapp-Simon, 2007; Lazaridou-Terzoudi, Kiyak, Athanasiou, & Melsen, 2003; Phillips, Bennett, & Broder, 1998). Essa situação é suscetível de provocar um sofrimento psicológico significativo na pessoa, afetando a sua qualidade de vida. Para lidar com o problema dentofacial, ela pode recorrer a estratégias de ocultamento (e.g. cobrir a boca com a mão quando fala, evitar o sorriso, mover os lábios de forma artificial, não gostar de tirar fotografias), ou, em casos extremos, pode manifestar comportamentos de fobia social traduzidos em sentimentos de medo e de insegurança emocional no relacionamento interpessoal.


Alterações Psicológicas Comuns na Fase Pré- Cirúrgica


A preocupação com a estética facial tem sido o principal motivo apontado pelos pacientes para justificarem o tratamento orto-cirúrgico (Belluci & Kapp-Simon, 2007; Hunt et al., 2001; Jacobson, 1984; Johnston et al., 2010; Pogrel & P. Scott, 1994; Sadek & Salem, 2007; Stirling et al., 2007; Vulink et al., 2008). De fato, a aparência facial constitui "uma motivação muito importante para que o paciente procure o tratamento ortocirúrgico, pois a beleza, em nossa sociedade, é muito valorizada e é um fator determinante no próprio relacionamento com as pessoas" (Ribas, Reis, França, & Lima, 2005, p. 76).


Por outro lado, o fato de a estética facial se constituir como o principal motivo do tratamento estará relacionado com as necessidades afetivas do paciente (e.g. de ser capaz de auto-apreciar, de querer ser valorizado(a) pelos outros, de sentir-se confortável no contato social). Estas parecem influenciar, de modo direto, a tomada de decisão independentemente do nível de conhecimento que o paciente tenha sobre o tratamento (Stirling et al., 2007). Assim, entendemos que o desejo de melhorar a aparência é acompanhado por expectativas de benefícios psicológicos em termos de melhoria da qualidade de vida, mas é preciso reconhecer que, embora as expectativas positivas sejam uma componente importante na motivação do paciente, não preparam para lidar com as circunstâncias imediatas do pós-operatório. A demasiada valorização dos benefícios, em detrimento do conhecimento das implicações reais do processo de tratamento, pode provocar ilusões e consequente insatisfação. A intervenção ortodôntica pode acentuar os estados emocionais negativos do paciente em consequência das mudanças na sua aparência facial e dentária. Relativamente ao grau de disfunção esquelética, a literatura aponta que os candidatos com Classe II de Angle (retrognatas) tendem a exibir mais a Perturbação Dismórfica Corporal (Vulink et al., 2008), são os menos felizes com a sua aparência (Johnston et al., 2010), tendem a mostrar reduzida auto-estima, sintomas depressivos, ansiedade e hostilidade (Burden et al, 2010), enquanto os candidatos com Classe III de Angle (prognatas) relatam mais preocupações, insegurança e consciência acerca do seu perfil facial (Johnston et al., 2010). Neste mister, parece-nos que aqueles que têm a deformidade com Classe III estão mais preparados para a mudança facial do que aqueles que têm a Classe II, já que aceitam melhor a ideia da transformação facial e são menos exigentes quanto ao resultado cirúrgico. 


As expectativas irrealistas, a realização prévia de cirurgia cosmética, a insegurança na tomada de decisão, o pobre apoio social (ou a pressão da família), o uso de substâncias psicotrópicas e a ausência de problema clínico justificativo da cirurgia são outras razões para maior preocupação por parte da equipe, e nestes casos não se deve prescindir da assitência do profissional de psicologia.



Alterações Psicológicas a Curto/ Médio Prazo



O período pós-operatório imediato corresponde à fase mais exigente do processo de tratamento. O sofrimento psíquico que a pessoa tem vindo a suportar ao longo da sua vida culmina no período pós-operatório a curto-prazo, pelo que a falta de preparação psicológica para lidar com os efeitos da cirurgia pode atrasar a recuperação pós-cirúrgica e, com efeito, diminuir o sucesso do tratamento, traduzido, em parte, na insatisfação/ desmotivação do paciente.


Os sintomas mais significativos desta fase abrangem a fraqueza física, as insônias, os problemas de dieta alimentar, a parestesia, o inchaço facial, a perda ou ganho de peso, a dificuldade de comunicação oral e o isolamento resultante da restrição de atividades socioprofissionais. A deterioração da qualidade de vida originada pelas limitações funcionais acontece, sobretudo, nas primeiras seis semanas a três meses. Esta será tanto mais grave quanto menos realistas forem as expectativas sobre a sintomatologia do pós-operatório imediato. Isso quer dizer que a recuperação será fortemente determinada pelo nível de conhecimento que se tem do processo de recuperação e como são antecipadas as consequências emocionais. C. Phillips e colaboradores (1998) observaram que os pacientes que inicialmente "sobreestimaram" o desconforto e a dor na fase pós-cirúrgica acabaram por admitir menos problemas em lidar com os sintomas (69%), em contraste com aqueles que tinham "subestimado" os custos emocionais da cirurgia (31%). Porquanto, a antecipação (ou as expectativas) dos efeitos da cirurgia influencia a intensidade dos sintomas que são experienciados durante a recuperação.


Alterações Psicológicas a Médio/ Longo Prazo





Depois da cirurgia, os resultados funcionais e estéticos são observados rapidamente e a pessoa encontra segurança emocional para fazer as transformações fundamentais na sua vida. Depreendemos, através da leitura de alguns artigos, que a reparação da aparência facial interfere com a saúde em geral, mas a saúde mental tende a sofrer mais alterações positivas do que a saúde física.


As mudanças no bem-estar, na qualidade de vida e nas características de personalidade dos pacientes afiguram-se estáveis a longo-prazo, especialmente, dois anos a cinco após a cirurgia. A partir desse período parecem não ocorrer melhorias significativas talvez porque o processo de adaptação à sua transformação ocluso-psicofacial chega ao fim. A pessoa aceitou a nova aparência facial e incorporou as consequências psicossociais na sua personalidade e estilo de vida (Cunningham et al., 2001).


Pogrel e P. Scott (1994) advogam que a intervenção orto-cirúrgica, além de permitir melhorias na saúde física, também constitui um "tratamento" para as perturbações psicológicas


Casos de Insatisfação





Muitos cirurgiões ortognáticos e ortodontistas já tiveram a experiência de lidar com casos de insatisfação ou de desordens psicopatológicas do paciente, ainda que a sua taxa de incidência varie entre os 5% e os 24,7% (C. Phillips et al., 1998; Pogrel & P. Scott, 1994). Os autores alegam que, nestas circunstâncias, as principais razões estão ligadas às histórias pessoais e necessidades socioafetivas do paciente e não propriamente à aparência facial (por exemplo, submeter-se à cirurgia para salvar ou melhorar uma relação íntima). Outros fatores como o pessimismo, a ansiedade, as expectativas irrealistas, o pobre apoio social podem prejudicar, de igual modo, o sucesso do tratamento (Belluci & Kapp-Simon, 2007; A. Scott et al., 2000). Esses dados apontam-nos para a necessidade de gerenciar as emoções do paciente durante o processo de tratamento, pois o eventual insucesso não se deverá exclusivamente às características psicológicas do paciente, mas sobretudo à deficiente relação de proximidade entre os intervenientes no processo.
 
Fonte dos dados citados neste texto: 
CARVALHO, Sónia Cortinhas; MARTINS, Eugénio Joaquim; BARBOSA, Maria Raquel. Variáveis psicossociais associadas à cirurgia ortognática: uma revisão sistemática da literatura. Psicol. Reflex. Crit., Porto Alegre , v. 25, n. 3, 2012 .
 
http://drfabiocalandrini.blogspot.com.br/2014/09/o-impacto-psicologico-da-cirurgia.html?m=1
 

domingo, 3 de agosto de 2014

O que poderei comer após minha cirurgia ortognática ? 

 

Uma alimentação adequada, em quantidade e qualidade, contendo todos os nutrientes que o organismo necessita, tem demonstrado ser uma das principais fontes para promoção e manutenção da saúde e redução dos riscos de doenças nutricionais.
Os candidatos à cirurgia ortognática devem estar informados, desde o pré-operatório, quanto aos critérios na alimentação no período pós-cirúrgico. Antes de partir para a preparação de um plano alimentar, vamos compreender as alterações que ocorrem no organismo submetido a uma cirurgia ortognática:
1 – Alterações Sistêmicas (do organismo).

Após um procedimento cirúrgico e anestésico, nosso organismo é submetido a um estresse orgânico que repercute com a produção de uma série de hormônios e substâncias. Dentre esses, destacamos a importância do cortisol, da adrenalina e das citocinas.
O cortisol tem um importante papel anti-inflamatório. Mas também é responsável por alterações no metabolismo dos nutrientes e no mecanismo da fome. Altos níveis de cortisol e adrenalina, como os encontrados após as cirurgias, induzem á maior disponibilização de nutrientes na corrente sanguínea a partir da gordura e dos músculos, contribuindo para reduzir a sensação de fome. Porém, é importante observar que essa redução da fome ocorre à custa do emagrecimento e da perda de massa muscular. Assim, a dieta pós-operatória deverá ser planejada de modo a equilibrar essas perdas.
As citocinas, por sua vez, são moléculas produzidas em grande quantidade após cirurgias. Embora tenham grande importância na modulação da resposta imunológica, algumas delas são responsáveis por induzir estados catabólicos (aumento de consumo energético), além de inibir a fome.
Assim, em resumo, temos no pós-operatório imediato de uma ortognática, uma situação em que há inibição da fome, e ao mesmo tempo um aumento do gasto energético e dos níveis de hormônios catabólicos. Uma dieta adequada será fundamental para uma rápida recuperação do organismo, evitando a perda excessiva de proteínas e outros nutriente essenciais.

2 – Edema
          
É de amplo conhecimento por parte dos candidatos à cirurgia ortognática, que o procedimento resulta em considerável edema (inchaço). O fato, é que este edema não ocorre apenas externamente. Ele também ocorre “para dentro”, ou seja, há edema dentro da boca, do nariz e na região da orofaringe. Este fato limita a ingestão de alimentos mais consistentes, sobretudo na primeira semana após a ortognática. Mais um elemento a ser levado em consideração na preparação do plano alimentar do paciente.

3 – Cicatrização Óssea

Para que ocorra cicatrização dos ossos da face na nova posição, é fundamental que haja completa imobilização entra os segmentos fixados. Atualmente conseguimos tal imobilização através da fixação com mini-placas (de titânio ou absorvíveis). O fato é que, mesmo com as mini-placas, os segmentos não permanecem completamente imóveis se submetidos às forças mastigatórias. Os potentes músculos da mastigação, quando colocados em função habitual, podem levar a pequenos movimentos, ou mesmo a deslocamentos ou fraturas das placas. Desta forma, a consistência dos alimentos é um importante aspecto a ser levado em consideração durante as sucessivas fases de recuperação após a cirurgia.
CHEGOU O DIA DA CIRURGIA. E AGORA?

Entendido o porquê das restrições alimentares no pós-operatório da cirurgia ortognática, vamos às possibilidades.
Nas 8 horas que antecedem o procedimento, é necessário o jejum completo, inclusive de água. Isso dará maior segurança ao procedimento anestésico, evitando que alimentos e líquidos no estômago seja aspirados (deslocados para o pulmão). Após a cirurgia, o retorno à alimentação e hidratação oral normalmente se dá normalmente após a alta da sala de recuperação pós-anestésica.
Na primeira semana indicamos alimentos líquidos, com poucos resíduos, de preferência frios ou gelados. Devem ser ingeridos com alta frequência. Sucos integrais, caldos coados, e alguns suplementos alimentares ricos em proteínas são usualmente prescritos por nossa nutricionista.
Na segunda semana, haverá maior tolerância por alimentos mais pastosos, como cremes, açaí e purês. Qualquer tentativa de mastigação está proibida. Mesmo que seja para frango desfiado ou carne moída! Extendemos essa recomendação para a terceira semana.
Na quarta e quinta semanas, a introdução dos alimentos semi-sólidos será permitida. Aí entra o arroz, feijão e legumes, desde que bem cozidos. Carnes somente processadas, que não exijam trituramento pelos dentes.
Na sexta semana inicia o retorno gradual à alimentação regular, de modo que com 6 a 7 semanas, o paciente já tenha recuperado seu padrão alimentar anterior à cirurgia.
É importante ressaltar que cada paciente apresenta necessidades individualizadas conforme sua composição corporal, hábitos alimentares, idade, extensão do procedimento, etc. Em nossa equipe contamos com uma nutricionista que fará uma avaliação detalhada do seu caso, preparando um plano alimentar específico. Nossos pacientes passam pelo exame de Bioimpedância com o equipamento Inbody, que analisa de forma precisa a massa magra, massa adiposa e água do organismo. Essa análise é feita antes e 6 semanas após a cirurgia, para avaliarmos o impacto nutricional da cirurgia no organismo.
Para um resultado excelente é preciso pensar em tudo!

 

Dr. Fábio Calandrini

Fonte: http://drfabiocalandrini.blogspot.com.br/2014/08/o-que-poderei-comer-apos-minha-cirurgia.html?m=1

terça-feira, 22 de julho de 2014

Os novos culpados da dor crônica

Com o impacto, o pé esquerdo de Helen escorregou da embreagem, torcendo seu tornozelo contra o piso do carro. No momento parecia ser apenas uma leve distensão, ela recorda, mas a dor nunca passava. Pelo contrário, só aumentava. Algum tempo depois, um toque mais leve, como o esfregar de um lençol, disparava choques lancinantes em sua perna. “A dor era tanta que eu não podia falar, embora por dentro estivesse gritando”, escreveu a jovem inglesa em um diário on-line sobre o mal que a atormentou pelos três anos seguintes.

A dor crônica que atinge pessoas como Helen é diferente do golpe de advertência da dor aguda. A dor aguda é a sensação mais intensa e alarmante que ocorre no corpo e tem como propósito fazer com que paremos de nos ferir. Esse tipo de dor também é chamado de dor patológica, porque uma causa externa, como um dano em algum tecido, produz os sinais que viajam pelo sistema nervoso até o cérebro, onde são interpretados como dor. Mas imagine se a agonia extrema de um ferimento nunca parasse, mesmo depois da cicatrização, ou se cada sensação comum do dia a dia se tornasse insuportavelmente dolorosa: “Eu não conseguia tomar banho... a água caía como se fossem facas”, lembra Helen. “As vibrações de um carro, alguém caminhando em um piso de madeira, pessoas conversando, uma brisa suave... tudo dava início à dor incontrolável. Analgésicos comuns… até mesmo morfina, não surtiam nenhum efeito. Era como se a minha mente estivesse pregando uma peça em mim”.

Infelizmente, Helen tinha razão. Sua dor crônica era causada por defeitos nos circuitos nervosos da dor, que os induziam continuamente a disparar um alarme falso, chamado dor neuropática, pois tem origem no comportamento indevido dos próprios nervos. Quando atingem o cérebro, os falsos sinais causam uma agonia tão real quanto qualquer dor por causas verdadeiras, embora ela nunca passe e os médicos em geral não consigam aliviá-la.

Pesquisas recentes estão finalmente elucidando por que os analgésicos tradicionais em geral são ineficazes no tratamento da dor neuropática: os alvos dos medicamentos são apenas os neurônios, enquanto a causa por trás da dor pode estar em células não neuronais disfuncionais chamadas células da glia, que se localizam no cérebro e na medula espinhal. Descobertas sobre como essas células, cuja tarefa é nutrir e regular as atividades dos neurônios, podem se desequilibrar e interromper o funcionamento neuronal inovam no tratamento da dor crônica. A pesquisa fornece ainda perspectiva surpreendente de uma conseqüência infeliz do tratamento atual contra a dor, que afeta algumas pessoas: o vício em narcóticos.
Circuitos e Interruptores da Dor

Para entender o que pode causar a persistência da dor depois da cicatrização de um ferimento, é preciso, antes de tudo, conhecer o que provoca a dor. Embora a sensação dolorosa seja percebida no cérebro, as células nervosas que a produzem não se localizam lá, mas sim na medula espinhal, coletando informações sensoriais de todo o corpo. Os neurônios dos gânglios da raiz dorsal (GRD), que representam o primeiro dos três estágios de um circuito de percepção de dor, incham seus corpos celulares, como cachos de uvas, nas juntas entre as vértebras da coluna, lembrando as fileiras duplas de botões de um paletó transpassado indo do cóccix ao crânio. Cada neurônio de GRD, como uma pessoa com os dois braços esticados, estende para fora uma antena delgada, conhecida como axônio ou fibra, para monitorar uma pequena região distante do corpo, enquanto estira seu outro axônio na medula espinhal para tocar um neurônio que retransmite impulsos pelo segundo estágio do circuito da dor, uma cadeia de neurônios da medula espinhal. Essas células espinhais transmissoras de dor reencaminham mensagens dos neurônios GRD até o estágio final, o tronco encefálico e, por fim, o córtex cerebral. Sinais de dor originados do lado esquerdo do corpo cruzam-se dentro da medula espinhal para atingir o lado direito do cérebro, e os sinais do lado direito são enviados ao lado esquerdo do cérebro.

A interrupção do fluxo de informação em qualquer ponto do circuito de três estágios da dor pode aliviar a dor aguda. Anestésicos locais, como a Novocaína usada por dentistas para extrair dente sem dor, adormecem as extremidades dos axônios em torno da região de injeção, impedindo as células de emitir impulsos elétricos. Um “bloqueio espinhal”, frequentemente usado para eliminar as dores do parto, interrompe os impulsos de dor no segundo estágio do circuito, uma vez que feixes de axônios das células dos GRD penetram a medula espinhal para se encontrar com os neurônios espinhais. Esse bloqueio deixa a mãe totalmente consciente para participar do parto indolor e auxiliá-lo. Uma injeção de morfina atua no mesmo local, reduzindo a transmissão de sinais de dor pelos neurônios espinhais enquanto as sensações não dolorosas permanecem intactas. Por outro lado, anestésicos gerais usados em grandes cirurgias interrompem o processamento
de informação no córtex cerebral, deixando o paciente completamente inconsciente de qualquer entrada sensorial dos caminhos neurais fora do cérebro.

Os analgésicos naturais do nosso corpo trabalham nas mesmas três partes do circuito da dor. Um soldado em combate carregado com adrenalina
pode sofrer uma grave lesão e não percebê-la, porque o córtex cerebral ignora os sinais de dor durante situações ameaçadoras e emocionalmente intensas. No parto natural, o corpo da mulher libera pequenas proteínas chamadas endorfinas, que amortecem a transmissão de sinais de dor assim que entram na medula espinhal.

Hormônios, estados emocionais e muitos outros fatores também podem alterar drasticamente a percepção de dor de uma pessoa, ao modular a transmissão de mensagens ao longo dos caminhos da dor. Além disso, muitos processos biológicos e substâncias que alteram o fluxo e o refluxo das moléculas pelos canais iônicos em células nervosas individuais contribuem em conjunto para regular a sensibilidade dos próprios nervos. Quando ocorre uma lesão, esses fatores podem facilitar os controles de disparo neuronal, auxiliando na tarefa dos neurônios de transmitir os sinais de dor.
Esse estado desimpedido, porém, pode durar tempo demais, deixando as células dos GRD hipersensibilizadas, de modo que emitam mensagens de dor sem estímulos externos. Essa situação é a causa principal da dor neuropática. O aumento da sensibilidade neuronal também pode causar sensações anormais de formigamento, queimação, cócegas e dormência (parestesia) ou, como na sensação de “chuva de facas” do caso de Helen, pode amplificar sensações leves de toque ou temperatura a níveis dolorosos (alodinia).

As tentativas de entender como os neurônios dos circuitos da dor tornam-se hipersensíveis depois de um ferimento há tempos têm se concentrado, o que não causa surpresa, nos eventuais problemas que ocorrem nos próprios neurônios – os resultados já forneceram algumas pistas, mas não um panorama completo do problema. Minha pesquisa e a de vários colegas demonstraram, por exemplo, que mesmo o ato de disparar impulsos para emitir sinais de dor altera a atividade dos genes dentro dos neurônios da dor. Alguns genes regulados por disparos neuronais codificam os canais iônicos e outras substâncias que aumentam a sensibilidade celular. A ativação intensa de células dos GRD quando algum tecido é lesionado pode então causar os tipos de mudanças de sensibilização nesses neurônios, resultando, eventualmente, em dor neuropática. Nossos estudos e o trabalho de outros laboratórios também revelam, entretanto, que os neurônios não são as únicas células que respondem a ferimentos dolorosos e liberam as substâncias que promovem a sensibilidade neural.

As células da glia são muito mais numerosas do que os neurônios na medula espinhal e no cérebro. Elas não disparam impulsos elétricos, como fazem os neurônios, mas têm algumas propriedades interessantes e importantes que influenciam a atividade neuronal. As células da glia mantêm o ambiente químico que envolve os neurônios: além de distribuírem a energia que sustenta as células nervosas, elas absorvem os neurotransmissores liberados pelos neurônios quando eles emitem um impulso a um neurônio vizinho. Às vezes as células da glia até liberam neurotransmissores para aumentar ou modular a transmissão de sinais neuronais. Quando os neurônios são lesionados, as células da glia emitem fatores de crescimento que promovem a sobrevivência e a cura neurais, e liberam substâncias que convocam as células do sistema imune a combater a infecção e promover a cura.
ANDREW SWIFT

As Células da Glia Viram Suspeitas
Cientistas já sabem que as células da glia respondem a ferimentos. Na Alemanha, em 1894, Franz Nissl notou que, depois que um nervo sofria uma lesão, as células da glia localizadas onde as fibras nervosas se conectam na medula espinhal ou no cérebro mudavam drasticamente. As células da
micróglia tornam-se mais abundantes, e células maiores, chamadas de astrócitos por causa de seus corpos em forma de estrela, muito mais encorpadas, inchadas com feixes grossos de fibras filamentosas que fortificam seu esqueleto celular.

Já se compreendia que essas respostas gliais serviam para promover o reparo dos nervos após o ferimento, mas como elas agiam ainda não estava claro. Além disso, se uma lesão – como um tornozelo torcido – ocorre longe do circuito espinhal da dor, os astrócitos da espinha precisam responder não diretamente ao ferimento, mas às mudanças da sinalização no ponto de retransmissão entre os GRD e os neurônios espinhais. Essa observação implicava que os astrócitos e a micróglia monitoravam as propriedades fisiológicas dos neurônios da dor.

Durante as duas últimas décadas as células da glia demonstram ter diversos mecanismos de detecção da atividade elétrica dos neurônios, incluindo canais para detectar o potássio e outros íons liberados no disparo neuronal de impulsos elétricos; e receptores superficiais para sentir os mesmos neurotransmissores que os neurônios usam para se comunicar através das sinapses. Glutamato, ATP e óxido nítrico são alguns dos neurotransmissores importantes liberados por neurônios que são detectados pelas células da glia, mas existem muitos outros. Esse conjunto de sensores permite que as células da glia monitorem a atividade elétrica nos circuitos neuronais ao longo do corpo e no cérebro e respondam a variações de condições fisiológicas.

Assim que os cientistas reconheceram a abrangência das respostas gliais à atividade neural, as atenções se voltaram ao comportamento suspeito dessas células de suporte em pontos de retransmissão da dor. Se as células da glia estavam monitorando as transmissões neurais da dor, será que também as estariam afetando? Exatamente 100 anos depois da observação de Nissl da resposta da glia a uma lesão no nervo, um simples experimento testou pela primeira vez a hipótese de que as células da glia podem participar do desenvolvimento da dor crônica. Em 1994, Stephen T. Meller e seus colaboradores da University of Iowa injetaram em ratos toxinas que matavam seletivamente os astrócitos, e então verificaram se a sensibilidade dos animais a estímulos dolorosos tinha diminuído. Isso não ocorreu, mostrando que os astrócitos não têm um papel óbvio na transmissão de dor aguda.
Depois os cientistas trataram ratos com um irritante da fibra nervosa que fazia com que gradualmente desenvolvessem dor crônica, semelhante à maneira como o acidente de carro irritou os nervos do tornozelo de Helen. Os animais que receberam veneno contra astrócitos desenvolveram muito menos dor crônica, revelando que os astrócitos eram de alguma maneira responsáveis pelo desencadeamento da dor crônica depois da lesão no nervo.

As células da glia liberam muitos tipos de moléculas que podem aumentar a sensibilidade dos neurônios dos GRD e da medula espinhal que retransmitem sinais de dor ao cérebro, incluindo fatores de crescimento e alguns dos mesmos neurotransmissores que os próprios neurônios produzem. Os cientistas perceberam que as células da glia interpretam disparos neurais rápidos e mudanças neurais induzidas por eles como um sinal de agonia nos neurônios. Como resposta, as células da glia liberam as moléculas sensibilizantes tanto para reduzir o estresse nos neurônios, facilitando sua sinalização, como para iniciar a cura.

Outra classe vital de moléculas geradas pelas células da glia em resposta a danos ou estresse neuronais são as citocinas, abreviação de “citocinéticas”, ou seja, relativas ao movimento celular. As citocinas agem como poderosos faróis químicos que as células do sistema imune seguem para atingir o local de uma lesão. Considere o imenso problema do tipo “agulha no palheiro” que uma célula de seu sistema imune enfrenta ao encontrar uma pequena farpa na ponta do seu dedo. Citocinas potentes liberadas pelas células danificadas pela farpa alertam as células imunes do sangue e da linfa para correr até a ponta do dedo, combater a infecção e iniciar o reparo. Elas induzem também mudanças no tecido e vasos sanguíneos locais que facilitam o trabalho das células imunes e promovem a cicatrização, mas isso resulta em vermelhidão e inchaço. Os efeitos coletivos dos sinais de citocinas são chamados de inflamação.

Uma farpa demonstra quão efetivas são as citocinas ao encaminhar as células imunes a uma ferida, mas ainda mais impressionante é como uma pequena farpa pode ser dolorosa – a dor é muito desproporcional ao minúsculo dano sofrido pelo tecido. Logo, até a área circundando a farpa torna-se inchada e doloridamente sensível, embora essas células vizinhas não tenham sido danificadas. A dor em torno de uma ferida é causada por outra ação de citocinas inflamatórias: elas amplificam muito a sensibilidade das fibras de dor. Sensores de dor supersensíveis próximos a uma lesão são a maneira de o corpo fazer com que nós deixemos a região em paz para que possa cicatrizar.
Os neurônios, como regra geral, não são a fonte das citocinas do sistema nervoso – esse papel é das células da glia. E, da mesma maneira como as citocinas podem tornar hipersensíveis as terminações nervosas em torno de uma farpa no dedo, as citocinas liberadas pelas células da glia na medula espinhal em resposta aos sinais intensos de dor podem se espalhar para as fibras nervosas vizinhas e também torná-las hipersensíveis. Pode-se então iniciar um ciclo de neurônios supersensibilizados que disparam desenfreadamente, induzindo as células da glia a um estado reativo, no qual elas liberam mais fatores sensibilizantes e citocinas, na tentativa de aliviar a tensão nos neurônios, mas, ao contrário, acabam prolongando-a. Quando isso ocorre, a dor pode se originar dentro da medula espinhal a partir de fibras nervosas que não estão diretamente lesionadas.

As respostas iniciais das células da glia a uma lesão são benéficas para a cicatrização, mas, se forem intensas demais, ou se continuarem por tempos longos demais, o resultado é uma dor crônica incontrolável. Vários grupos de pesquisa têm documentado os ciclos de retroalimentação que induzem as células da glia a prolongar a liberação de fatores sensibilizantes e sinais inflamatórios que levam à dor neuropática, e muitos têm realizado experimentos para tentar reverter esses processos. Esse trabalho conseguiu até desenvolver maneiras de tornar mais efetivos os medicamentos usados para tratar a dor aguda.

FATOS DA DOR

10% a 20% da população dos Estados Unidos e da Europa afirmam sofrer de dor crônica.
59% das pessoas que sofrem de dor crônica são mulheres.
18% dos adultos com dor crônica procuram terapias medicinais alternativas. Apenas 15% dos médicos clínicos gerais sentem-se à vontade para tratar pacientes com dor crônica, de acordo com pesquisa recente.
41% dos médicos afirmaram que esperam os pacientes solicitarem especificamente analgésicos narcóticos antes de prescrevê-los.
Cortando a Dor pela Raiz

No passado, todos os tratamentos de dor crônica buscavam amortecer a atividade dos neurônios, mas a dor não pode ser interrompida se as células da glia continuarem a incitar as células nervosas. Descobertas de como as células da glia caem em seu círculo vicioso de sensibilização dos nervos criam estratégias para atingir as células da glia disfuncionais e interromper uma fonte fundamental da dor neuropática. Tentativas experimentais de tratar a dor neuropática pelo controle das células da glia focalizam-se, portanto, em aquietar essas células, bloqueando moléculas e sinais que desencadeiam o processo inflamatório, e enviando sinais anti-inflamatórios.

Em experimentos com animais, por exemplo, Joyce A. DeLeo e seus colegas da Dartmouth Medical School demonstraram que uma substância chamada propentofilina suprime a ativação dos astrócitos e, portanto, a dor crônica. O antibiótico minociclina impede que tanto os neurônios como as células da glia produzam citocinas inflamatórias e óxido nítrico, além de reduzirem a migração de micróglias na direção das lesões, sugerindo que o medicamento poderia evitar a hiperatividade glial.

Um método semelhante concentra-se nos receptores Toll-like (TLRs), proteínas superficiais das células gliais que reconhecem certos indicadores de células sob estresse e incitam as células da glia a emitir citocinas. Linda R. Watkins, da University of Colorado em Boulder, e seus colaboradores demonstraram em animais que o uso de uma substância experimental para bloquear um subtipo particular de TLR, o TLR-4, em células gliais da medula espinhal revertia a dor neuropática proveniente de lesões no nervo ciático. Curiosamente, a naloxona – fármaco usado para reduzir os efeitos de opiatos em tratamentos contra o vício – também bloqueia respostas gliais à ativação do TLR-4. Watkins demonstrou em ratos que a naloxona também pode reverter a dor neuropática totalmente desenvolvida.

Outro medicamento existente, na verdade uma antiga substância analgésica que pode ser usada quando muitas outras falham, é a maconha, legalizada para uso medicinal em alguns estados americanos. As substâncias da planta de maconha imitam compostos naturais do cérebro chamados canabinoides, que ativam certos receptores em neurônios e regulam a transmissão de sinais neurais.
Entretanto, há dois tipos de receptores de canabinoides no cérebro e no sistema nervoso: o CB1 e o CB2. Eles têm funções diferentes. A ativação do receptor CB2 alivia a dor, enquanto a ativação dos receptores CB1 induz aos efeitos psicoativos da maconha. É notável que o receptor CB2, que alivia a dor, não esteja presente nos neurônios da dor; ele aparece nas células da glia. Quando canabinoides unem-se a receptores microgliais CB2, as células reduzem sua sinalização inflamatória. Estudos recentes descobriram que, à medida que a dor crônica se desenvolve, o número de receptores CB2 da micróglia aumenta, um sinal de que as células se esforçam para tentar capturar mais canabinoides em sua vizinhança para promover alívio analgésico. Agora,as companhias farmacêuticas buscam intensamente medicamentos que possam ser usados para controlar a dor através da atuação nos receptores gliais CB2 sem drogarem as pessoas.

O bloqueio de citocinas inflamatórias usando fármacos anti-inflamatórios já existentes, como a anakinra (Kineret) e o etanercepte (Enbrel), também reduziu a dor neuropática em animais. Além de interromper sinais inflamatórios, a adição de citocinas anti-inflamatórias, como a interleucina-10 e a IL-2, pode acalmar a dor neuropática em animais, como demonstraram vários grupos. Dois medicamentos existentes, a pentoxifilina e o AV411, inibem a inflamação ao estimular as células a produzir IL-10. Além disso, grupos diversos reverteram a dor neuropática durante até quatro semanas ao injetar os genes que dão origem à IL-10 e à IL-2 nos músculos ou na espinha de animais.

Poucos desses fármacos já foram testados contra a dor em humanos (ver tabela na pág. ao lado), incluindo o AV411, que já é utilizado como tratamento anti-inflamatório em derrames, no Japão. Um teste na Austrália mostrou que pacientes com dor voluntariamente reduziram suas dosagens de morfina enquanto estavam sendo tratados com o medicamento, um sinal de que o AV411 contribuiu para aliviar sua dor. Mas o AV411 pode estar agindo por meio de mecanismos que vão além de acalmar a dor causada pela inflamação, realçando uma reviravolta na história das células da glia e da dor.
FATORES DE RISCO PARA DOR CRÔNICA DO PESCOÇO OU DAS COSTAS

Idade avançada
Ansiedade
Ser mulher
Depressão
Levantamento de peso
Viver sozinho
Uso de nicotina
Não praticar atividades físicas
Obesidade
Trabalho repetitivo
Estresse
Insatisfação com o trabalho

Equilíbrio Restaurado

A morfina é um dos mais potentes analgésicos conhecidos, mas os médicos são cautelosos por causa de suas propriedades perversas, a ponto de muitos prescreverem doses inferiores às devidas mesmo para pacientes com câncer terminal. Como a heroína, o ópio e narcóticos modernos, como o OxyContin, a morfina ameniza a dor enfraquecendo a comunicação entre os neurônios da medula espinhal e diminuindo, assim, a transmissão dos sinais de dor.

Infelizmente, o poder da morfina e de outros narcóticos de bloquear a dor enfraquece rapidamente com o uso repetido, uma propriedade chamada tolerância. Doses mais fortes e mais frequentes tornam-se necessárias para obter o mesmo efeito. Pacientes com dor crônica podem ficar viciados, combinando seu sofrimento com uma debilitante dependência de drogas. Os médicos, temendo que sejam considerados suspeitos de traficar, em vez de prescrever quantidades tão grandes de narcóticos, são geralmente forçados a limitar os pacientes a dosagens que não são mais efetivas para aliviar sua agonia. Alguns pacientes recorrem ao crime para obter prescrições ilegais; e há até aqueles que acabam se suicidando para pôr fim a seu sofrimento. Uma nova descoberta na intersecção entre alívio de dor, glia e vício em drogas evidencia que as células da glia são as responsáveis pelo desenvolvimento da tolerância à heroína e à morfina.
As suspeitas de que as células da glia estejam envolvidas na tolerância a narcóticos surgiu com a observação de que, da mesma maneira como um viciado sofre quando larga a heroína de uma só vez, pacientes dependentes de analgésicos narcóticos que interrompem o tratamento bruscamente sofrem crises dolorosas de abstinência clássica. Os pacientes (e viciados em heroína) tornam-se tão hipersensíveis que mesmo som e luz comuns causam dores lancinantes. A semelhança entre esses sintomas e a hiperestesia observada na dor neuropática sugere a possibilidade de uma causa comum.

Em 2001, Ping Song e Zhi-Qi Zhao, do Instituto de Fisiologia de Xangai, testaram se o desenvolvimento da tolerância à morfina envolvia as células da glia. Quando deram doses repetidas de morfina a ratos, os pesquisadores viram aumentar o número de astrócitos reativos na medula espinhal. As mudanças na glia causadas pelas repetições nas doses de morfina foram idênticas àquelas observadas na medula espinhal depois de um ferimento ou quando se desenvolve a dor neuropática. Os cientistas então eliminaram os astrócitos com o mesmo veneno usado por Meller para mortecer o desenvolvimento de dor crônica em ratos. A tolerância à morfina nesses animais foi reduzida drasticamente, indicando que as células da glia contribuem de alguma maneira.

Muitos grupos de pesquisa desde então tentam bloquear sinais entre neurônios e glia (por exemplo, desativando receptores de citocinas específicos das células da glia), assim como procuram testar se a tolerância à morfina é afetada. Essa pesquisa mostra que bloquear sinais inflamatórios com destino ou origem nas células da glia não altera em nada as sensações de dor aguda normal, mas, se os bloqueadores forem injetados juntamente com morfina, doses mais baixas do analgésico são requeridas para obter o mesmo alívio, e a duração do alívio da dor é dobrada. Essas descobertas indicam fortemente que as células da glia estavam se opondo ao efeito aliviador da morfina.

As ações para minar a atuação da morfina fazem parte da tarefa fundamental das células da glia de manter a atividade equilibrada em circuitos neurais. Como os narcóticos diminuem a sensibilidade dos circuitos da dor, as células da glia respondem liberando substâncias neuroativas que elevam a excitabilidade neuronal para restaurar os níveis normais de atividade nos circuitos neurais. Com o tempo, a influência glial aumenta a sensitividade dos neurônios da dor, e, quando o efeito amortecedor dos circuitos da dor causado pela heroína ou por analgésicos narcóticos é repentinamente removido pela abstinência brusca da droga, os neurônios disparam intensamente, causando supersensibilidade e sintomas dolorosos de abstinência. Em animais de laboratório, a crise dolorosa de abstinência do vício em morfina pode ser drasticamente reduzida por medicamentos que bloqueiam as respostas gliais.

A modulação da atividade das células da glia, portanto, pode ser comprovadamente uma chave não apenas para aliviar a dor crônica, mas também para reduzir a probabilidade de desenvolvimento de vício em pessoas tratadas com analgésicos narcóticos. Pode-se imaginar quais teriam sido os benefícios que medicamentos com atuação sobre a glia teriam trazido para aqueles que há muito tempo buscaram controlar tais fontes imensas de sofrimento e tragédia para o homem. Mas as conexões entre neurônios, dor e vício se esquivaram dos cientistas do passado, que ignoravam os parceiros vitais dos neurônios – as células da glia. 
 
 

Fonte Scientific American Brasil

quarta-feira, 18 de junho de 2014

Tratamento Dentário sem brocas !!


Estudo combinou células de gengiva à de ratos (Foto: PA/BBC) 
 
Nova tecnologia pode significar o fim das
assustadoras brocas (Foto: PA/BBC)
 
Pesquisadores britânicos acreditam ter encontrado uma maneira de fazer tratamentos dentários sem a necessidade da broca.
Os cientistas da universidade King's College London acreditam que eletricidade pode ser usada para fortalecer um dente ao forçar minerais para dentro da camada do esmalte dentário.
Assim, eles esperam que a técnica acabe não só com a necessidade de brocas, mas também de injeções e obturações.
Mineirais como o cálcio e fosfato circulam naturalmente para dentro e fora do dente. O ácido produzido pelas bactérias que processam o alimento na boca ajuda os dentes a perder esses minerais.

Na experiência, o grupo de pesquisadores aplicou um coquetel de mineirais e depois usou uma fraca corrente elétrica para direcionar os minerais para dentro do dente.
Eles dizem que, assim, o processo, chamado de Electrically Accelerated and Enhanced Remineralisation ('Remineralização Eletricamente Acelerada e Aumentada', em tradução livre), reforça o dente.

Estágio inicial

A empresa Reminova, baseada em Perth, na Escócia, foi criada para tornar a técnica disponível para dentistas nos próximos três anos.
Não há dispositivo para ser visto, e devido à confidencialidade, não houve nenhuma evidência publicada sobre a eficácia da técnica em publicações médicas.
Nigel Pitts, um dos inventores, e um investidor na nova empresa, disse à BBC: "O estágio ainda é inicial, você não começa com o produto final, mas estamos animados porque acreditamos que a técnica seja inovadora."
"Nós criamos uma empresa para transformar uma tecnologia de demonstração em um produto comercial viável que podemos colocar nas mãos de dentistas por todo o mundo."
Ele disse que a tecnologia tem o potencial de substituir a necessidade de várias obturações, mas que não pode atacar cáries em "estágio final".
"O que a técnica não vai fazer é o dente voltar a crescer fisicamente", ele disse.

Imagem de cima mostra cárie dentária antes do tratamento e imagem de baixo mostra cárie depois do tratamento (Foto: Simbios at Abertay University Dundee/BBC)Imagem de cima mostra cárie dentária antes do tratamento e imagem de baixo mostra cárie depois do tratamento (Foto: Simbios at Abertay University Dundee/BBC)